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“Que mudanças precisamos de implementar para garantir que os direitos laborais não desapareçam no futuro próximo?” Clima e Trabalho – Unindo Diferentes Mundos – Leonor Canadas

Em resposta à pergunta: “que mudanças precisamos de implementar para garantir que os direitos laborais não desapareçam no futuro próximo”, a resposta é que precisamos de mudar TUDO.

Isto porque as alterações climáticas vão, inevitavelmente, mudar tudo e levar a uma enorme disrupção e perda de direitos. Já estão em curso transformações nas diferentes esferas da economia e das nossas vidas e em diferentes partes do mundo devido às alterações climáticas. No entanto, estas transformações não serão justas e não se traduzirão numa sociedade mais justa e inclusiva, a menos que sejam impulsionadas pela sociedade no seu conjunto. A questão da justiça é importante porque a transição energética numa parte do mundo não pode, de forma alguma, significar injustiça, exploração e opressão noutras partes do mundo.

As atuais transformações que estão a acontecer são, pelo contrário, transformações que vão contra a maioria da classe trabalhadora, e especialmente contra as comunidades mais vulneráveis e oprimidas. Uma grande parte do trabalho está atualmente ao serviço da acumulação e da expansão do capital e, por conseguinte, muitas vezes associado a um conflito entre os interesses do “trabalho” e o ambiente e clima – o que, no fim de contas, é um conflito entre as pessoas e aqueles que lucram com a exploração do trabalho. Porque o trabalho está, em grande medida, organizado e planeado de forma a servir poucos e não muitos. Pelo contrário, num mundo em que o trabalho sirva efetivamente os interesses e as necessidades dos trabalhadores e das populações, esse conflito não existe, pois nesse caso o trabalho é planeado e organizado de forma a proteger o equilíbrio climático e os recursos naturais.

É esse o mundo de que precisamos. É esse o mundo que temos de construir. Precisamos, portanto, de voltar a colocar os setores essenciais, os recursos naturais e o planeamento da economia nas mãos dos cidadãos. E o movimento dos trabalhadores é fundamental na construção desse mundo. É aqui que reside muito do conhecimento e capacidades para por em prática esta transformação, e como tal, é também aqui que reside um enorme poder social para efetivamente mudar o mundo.

O movimento dos trabalhadores esteve sempre na linha da frente de quase todas as grandes mudanças socioeconómicas e assumiu um papel ativo na luta por uma sociedade melhor e por direitos sociais mais fortes. Numa luta tão existencial como esta, contra o caos climático, o movimento dos trabalhadores não pode estar ausente e, pelo contrário, deve de ser um agente político ativo na construção de um forte movimento internacional baseado na solidariedade.

Travar a crise climática e lidar com os efeitos já presentes das alterações climáticas implicará muito trabalho! Mas para que este seja um processo justo será necessário que este processo seja conduzido por instituições públicas e na óptica dos serviços públicos, com fortes garantias sociais e redes de segurança social para os trabalhadores e as comunidades afectadas.

É, de facto, importante reconhecer que, e cito, “a transição necessária para cumprir as metas de descarbonização implicará mudanças substanciais que afectarão os trabalhadores, especialmente em muitas áreas de emprego relacionadas com a energia, e muitas dessas mudanças podem ser muito perturbadoras se os seus impactos não forem abordados”. (como indicado no “Programa Sindical para um Futuro Energético Público e com Baixas Emissões de Carbono”, assinado por mais de 30 sindicatos de todo o mundo.)

É, portanto, necessária uma mudança completa no modelo de produção e de organização económica. Este não será um processo liderado por empresas e seguindo os interesses privados e do capital. Tem de ser um processo de planeamento democrático e de acesso democrático aos recursos naturais e aos meios de produção para uma economia pensada para sustentar as necessidades reais das pessoas e servir os interesses das pessoas.

Precisamos de construir um mandato democrático pró-público para uma abordagem pública e planeada da transição energética, que criará milhões de empregos climáticos. Precisamos de construir um mandato para um futuro público sob formas descoloniais de controlo colectivo, transparente e democrático.

Nos casos de infra-estruturas poluentes e com grande intensidade de carbono, isto pode assumir a forma da criação de Comissões para uma Transição Justa que centrem o debate nas pessoas e no planeta e onde a participação dos trabalhadores seja fundamental. A transição tem de ser liderada por instituições públicas a nível local, regional e nacional, através de investimentos públicos na criação de empregos climáticos seguros e de qualidade e de serviços públicos universais. Os trabalhadores dos setores intenso em carbono devem receber formação e requalificação profissional, deve ser-lhes garantia de rendimentos e prioridade no acesso a Empregos para o Clima na nova economia.

A nível nacional, a criação de uma Comissão de Justiça Climática, que exclua as empresas fósseis e com um mandato para coordenar os esforços de transição no âmbito da esfera pública – sob escrutínio pública e ao abrigo da legislação climática – pode ser fundamental.

Estamos a atravessar uma emergência climática, uma emergência de direitos humanos e que precisamos de reduzir as emissões de forma drástica e urgente. A redução das emissões não pode, de forma alguma, ser adiada. Temos de lutar por reduções drásticas das emissões de GEE e por uma transição justa como se as nossas vidas dependessem disso, porque dependem.

Precisamos de movimentos pró-activos, que elaborem os seus próprios planos e programas para organizar o trabalho, a produção e a sociedade como um todo. Precisamos que os trabalhadores e o movimento laboral questionem novamente a forma como o trabalho está organizado, o que está a ser produzido e porquê, em benefício e em detrimento de quem.

Temos de nos libertar de um modelo económico baseado na exploração. Não há contradição entre justiça laboral e justiça climática. Pelo contrário, há uma compatibilidade total. Fim do mês, fim do mundo, a mesma luta. Uma luta pela vida, a luta das nossas vidas.

 

 

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