Continuar a culpabilizar a humanidade da atual crise climática é um erro. Sabemos quem é (e quem sempre foi), historicamente, o verdadeiro responsável; alimentando-se do lucro em detrimento da vida, numa perspetiva de crescimento económico infinito, num planeta com recursos finitos: o Capitalismo.
O Capitalismo, sistema e ideologia económica que assenta na propriedade privada e no mercado e livre concorrência para a acumulação de “mais-valia” (ou lucro), é incompatível com as soluções necessárias para travarmos a crise climática, de uma forma mais ecológica, sustentável e justa.
Surgem, desta forma, as falsas soluções do capitalismo “verde”, eco-capitalismo ou ainda capitalismo natural, vertente do capitalismo que visa apenas prolongar o sistema e adaptar as economias de mercado a uma visão mais “sustentável”, continuando a produzir capital através do famoso greenwashing. Um puro antagonismo e contra-senso. É impossível coexistirmos com o sistema que nos está a levar ao colapso. Não são as inovações tecnologias ou uma maior eficiência na exploração de recursos que vão resolver esta crise ambiental e social, vão apenas intensificá-la. A partir do momento em que o crescimento económico é a principal barreira para uma transição económica que priorize as pessoas acima do lucro, o capitalismo “verde” torna-se incongruente, uma vez que não impõe limites ao crescimento. É mais do mesmo; o business as usual. Acordos como o European Green Deal mostram claramente esta posição capitalista “verde”, neocolonialista e extractivista, que mercantiliza a natureza e a transforma numa commodity.
No Alentejo, o capitalismo “verde” tem conquistado terreno através das mãos de grandes empresas e da tentativa de implementação de projetos megalómanos insustentáveis, como a “monocultura” de painéis fotovoltaicos que cobrem hectares e hectares de terra, à semelhança da agricultura intensiva de olivais, amendoeiras e frutos silvestres no Litoral Alentejano.
Estes megaprojectos solares propiciam a desflorestação de floresta autóctone e do montado alentejano, desertificando e erodindo os solos, contribuindo para grandes perdas de biodiversidade e impacto em espécies protegidas, e afectando as comunidades locais. Iniciativas como “Não à central fotovoltaica do Cercal do Alentejo”, do movimento Juntos pelo Cercal, demonstram a contestação social e local contra projetos desta natureza, criticando, simultaneamente, a Agência Portuguesa do Ambiente (APA) pela falta de diálogo entre todas as partes.
Não nos podemos deixar iludir desta faceta do capitalismo que tem aproveitado e investindo em energias renováveis apenas para se perpetuar, dando uso de propaganda enganosa e auto intitulando-se de “verde”. A título de exemplo, a empresa ISDC de desenvolvimento de projetos fotovoltaicos, comprada em 2020 pela Galp Energia, tenciona acrescentar 248 hectares de painéis solares para produção de energia no concelho alentejano de Ourique. Detentora da Petrogal, a Galp Energia continua, assim, a apostar nos combustíveis fósseis; a refinaria de Sines permanece activa sem um plano de transição justa nem cortes nas emissões, sendo a infraestrutura mais poluente do país, emitido, em 2019, aproximadamente 2,4 milhões de tCO₂eq. O setor da energia é, por conseguinte, um dos setores que contribuiu mais para a emissão de GEE em Portugal (20,5%, em 2019), juntamente com o setor dos transportes (28%, em 2019) e as indústrias de celuloses e cimenteiras. A lógica do lucro continua, desta forma, a imperar, e as empresas e os lobbys que controlam estes setores não são responsabilizadas.
Em Portugal, devido à nossa responsabilização histórica, temos que cortar 74% das emissões actuais até 2030; as energias renováveis não estão a substituir os fósseis nem a cortar emissões de dióxido de carbono e metano. Devemos, urgentemente, desconstruir a estrutura socioeconómica da nossa sociedade e dos modelos produtivos, valorizando o local e a descentralização da produção de energia e eletricidade, e garantindo uma democracia energética.